A inaceitável incoerência da ministra Cármen Lúcia em defesa da Censura
A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), voltou ao centro das discussões sobre liberdade de expressão no Brasil após declarações e votos que, para críticos, revelam uma postura contraditória da magistrada. Embora afirme ser contra qualquer forma de censura, a ministra tem apoiado decisões que restringem manifestações públicas e conteúdos audiovisuais sob o argumento de proteger a democracia — o que tem sido interpretado por setores da sociedade como censura disfarçada.
Durante o julgamento do Marco Civil da Internet, Cármen Lúcia declarou:
“Censura é proibida constitucionalmente, é proibida eticamente, é proibida moralmente, é proibida eu diria até espiritualmente. Mas não pode, também, permitir que nós estejamos numa agora [praça pública] em que haja 213 milhões de pequenos tiranos soberanos. Soberano é o Brasil, soberano é o Direito brasileiro.”
A fala causou reação nas redes sociais e entre juristas, que apontaram a aparente contradição entre a condenação veemente à censura e a defesa de medidas que limitam o discurso público. A frase “213 milhões de pequenos tiranos” foi interpretada por muitos como uma generalização agressiva dos cidadãos brasileiros, sugerindo que o Estado deve conter excessos da população na arena digital — mesmo que à custa da liberdade de expressão.
Reincidência
A crítica não é inédita. Em 2022, às vésperas das eleições presidenciais, a ministra votou a favor de uma decisão que suspendeu a exibição do documentário “Quem Mandou Matar Jair Bolsonaro?”, produzido pela Brasil Paralelo. A justificativa, novamente, seguiu a mesma linha:
“Não se pode permitir a volta de censura sob qualquer argumento no Brasil, mas eu vejo isso como uma situação excepcionalíssima.”
A repetição do padrão — condenação da censura seguida de sua aplicação sob justificativas “excepcionais” — tem alimentado o debate sobre até que ponto o STF está se afastando do texto constitucional para atender a demandas políticas ou proteger instituições.
“Tiranos chamando os outros de tiranos”
Críticos mais duros acusam o Supremo de usar a retórica da proteção democrática para aplicar medidas autoritárias. “O método histórico de tiranos é atribuir tirania aos outros para justificar a própria”, escreveu um comentarista político nas redes sociais, em resposta à declaração da ministra.
A crítica reflete um temor crescente entre setores liberais e conservadores: o de que o Judiciário brasileiro, ao tentar conter discursos de ódio, fake news e ameaças institucionais, acabe criando uma jurisprudência que legitime a censura de conteúdo legítimo, sob o manto da “excepcionalidade”.
Um debate em aberto
O STF argumenta que suas decisões têm como objetivo proteger o Estado Democrático de Direito diante de novas ameaças digitais e de tentativas de desestabilização institucional. Já os críticos, por sua vez, apontam para o risco de que decisões com viés político comprometam a imparcialidade da Corte e fragilizem as garantias constitucionais.
Enquanto isso, figuras como Cármen Lúcia se tornam símbolos dessa nova fase do Judiciário — marcada por discursos ambíguos e decisões controversas, num Brasil cada vez mais polarizado.