Analistas do mercado estão expressando ceticismo em relação às metas de resultado primário propostas pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no novo arcabouço fiscal. Enquanto o Ministério da Fazenda busca zerar o déficit no próximo ano e obter superávits a partir de 2025, as projeções dos operadores financeiros apontam para um cenário mais pessimista.
O cumprimento dessas metas fiscais é considerado fundamental pelo governo para possibilitar o aumento dos gastos públicos ano após ano e, assim, implementar as políticas públicas prometidas durante a campanha eleitoral.
Aprovada pela Câmara dos Deputados no final de maio e ainda pendente de aprovação pelo Senado, a proposta do governo para um novo regime fiscal estabelece uma meta de resultado primário neutro em 2024 e, posteriormente, um superávit equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2025 e 1% em 2026.
O texto prevê uma margem de tolerância de 0,25 ponto percentual do PIB para a meta de cada ano – ou seja, o governo ainda cumpriria a meta se apresentasse um déficit de até -0,25% do PIB em 2024.
No entanto, a mediana das expectativas dos operadores financeiros aponta para um déficit equivalente a 0,7% do PIB no próximo ano, conforme o último boletim Focus do Banco Central. Para os anos seguintes, as projeções indicam novos déficits de 0,34% e 0,2% do PIB, respectivamente. Em suma, as expectativas são de que as contas públicas permaneçam no vermelho durante todo o mandato de Lula.
Entre as razões para esse prognóstico estão as incertezas em relação às medidas que o governo precisa adotar para aumentar a arrecadação e a possibilidade de um aumento real dos gastos além do estabelecido pelas próprias regras fiscais.
Desde a apresentação do novo arcabouço fiscal, o aspecto mais criticado da proposta está na necessidade de um crescimento robusto da receita para sustentar o modelo. Vários economistas consideram inevitável um aumento da carga tributária nos próximos anos.
No entanto, mesmo com as medidas anunciadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o impacto estimado ainda seria insuficiente para zerar o déficit nas contas públicas.
Para 2023, o próprio governo projeta um resultado primário negativo de R$ 136,2 bilhões, revisado para baixo em relação à estimativa anterior de R$ 107,5 bilhões.
Ao mesmo tempo, uma disposição incluída na versão final do projeto permite que o Executivo aumente o espaço para novas despesas em maio de 2024, caso a receita projetada para o exercício, ao final do segundo bimestre, seja superior ao previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA).
Essa ampliação do limite de gastos ocorrerá na proporção da diferença entre o projetado para 2024 em relação ao realizado em 2023 e o estabelecido na LOA, com um máximo de aumento real de 2,5%.
Instituições financeiras como Bradesco, XP e IFI preveem um déficit nas contas públicas de 1% do PIB em 2024.
A XP Investimentos destaca que, para alcançar um resultado primário neutro em 2024, de acordo com a meta definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo precisaria de R$ 110 bilhões a R$ 150 bilhões adicionais em receitas líquidas de transferências. Até o momento, as medidas anunciadas pelo governo são consideradas insuficientes para atingir esse valor.
Líderes da oposição, como o senador Rogério Marinho (PL-RN), afirmam que o novo arcabouço fiscal é uma narrativa fictícia, e o governo deliberadamente não cumprirá a meta em 2024. O projeto de lei complementar que estabelece o novo regime fiscal não prevê a imputação de crime de responsabilidade ao presidente em caso de descumprimento da meta, apenas a exigência de enviar uma carta ao Congresso com as justificativas para o não cumprimento.