Novo Código Civil: projeto cria herança digital e muda direito de cônjuges
O Senado analisa uma proposta de reforma no Código Civil que pode mudar significativamente as regras de herança no Brasil. Entre as principais mudanças está a exclusão de cônjuges e companheiros da lista de herdeiros necessários — que passaria a incluir apenas ascendentes (pais e avós) e descendentes (filhos e netos). Além disso, o projeto cria o conceito de “herança digital”, algo inédito na legislação brasileira.
A proposta foi elaborada por uma comissão de juristas formada em 2023, por iniciativa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O texto final foi apresentado oficialmente em janeiro de 2025 e aguarda despacho da Presidência do Senado para começar a tramitar.
Patrimônio e herança digital
A atualização do Código Civil inclui o reconhecimento do chamado “patrimônio digital”, abrangendo ativos intangíveis e imateriais com valor econômico, pessoal ou cultural. Isso inclui desde criptomoedas e milhas aéreas até perfis em redes sociais, arquivos digitais, senhas, dados bancários, fotos e vídeos armazenados online.
Segundo Flávio Tartuce, advogado e relator da comissão de juristas, a legislação atual ignora esse tipo de bem, o que tem prejudicado os herdeiros. “Hoje a gente não tem nada sobre esse tema na legislação. Pela ausência de lei, a conclusão do Judiciário tem sido que, quando morremos, esses direitos morrem conosco”, afirmou Tartuce.
Pelo novo texto, os herdeiros só poderão acessar mensagens privadas e outros dados sensíveis do falecido se houver autorização expressa deixada em vida — ou por meio de decisão judicial que comprove necessidade.
Mudanças na sucessão entre cônjuges
Outra proposta importante é a reestruturação da ordem de vocação hereditária. Com a nova redação, cônjuges e companheiros deixam de ser herdeiros necessários — posição que dá prioridade legal à parte da herança. Agora, passam a ocupar o terceiro lugar na ordem de sucessão legítima, atrás de filhos (descendentes) e pais (ascendentes).
Além disso, o projeto propõe o fim do direito de cônjuges aos bens particulares do parceiro falecido — ou seja, os bens que já pertenciam à pessoa antes do casamento ou união estável.
A advogada e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Maria Berenice Dias, avalia a mudança como positiva. Em entrevista à CNN, ela destacou que o modelo atual permite o que chama de “enriquecimento sem causa” por parte de cônjuges sobreviventes. “A proposta busca maior equilíbrio e justiça patrimonial nas relações familiares”, afirmou.
Próximos passos
A reforma do Código Civil é considerada uma das mais amplas em décadas e ainda deve passar por longas discussões no Congresso. Especialistas apontam que o debate promete ser intenso, principalmente em relação à exclusão de cônjuges como herdeiros necessários — mudança que pode impactar milhões de famílias brasileiras.