Haddad é desmentido e ridicularizado pelo presidente do Banco Central

A transição de liderança no Banco Central do Brasil, que normalmente se daria sob protocolos técnicos e institucionais discretos, ganhou destaque ao se tornar palco de declarações divergentes entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o atual presidente da autoridade monetária, Gabriel Galípolo.

Em um raro contraste entre duas figuras próximas do mesmo campo político, Haddad classificou o processo como “complexo” e “constrangedor”, enquanto Galípolo, seu ex-secretário e agora presidente do Banco Central, afirmou que a sucessão foi “exemplar”.

Haddad: “Constrangimentos” marcaram a transição

Em entrevista recente, Fernando Haddad fez críticas veladas à forma como se deu a troca de comando na autarquia. Para ele, a transição esteve longe do ideal e foi marcada por situações embaraçosas. Apesar de não ter revelado detalhes, o ministro sugeriu a existência de entraves institucionais — possivelmente relacionados ao relacionamento difícil entre o governo federal e a gestão anterior do BC, liderada por Roberto Campos Neto.

Desde o início do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a relação com o Banco Central foi tensa, com críticas públicas à condução da política monetária e ao nível da taxa básica de juros (Selic), que o governo considerava excessivamente elevado.

Galípolo rebate: transição foi “exemplar”

Em um movimento que surpreendeu o meio político, Gabriel Galípolo adotou um tom oposto ao de Haddad ao comentar o mesmo processo. Questionado sobre a fala do ministro da Fazenda, Galípolo afirmou:

“A transição foi feita de maneira bastante exemplar do ponto de vista institucional.”

O novo presidente do Banco Central ainda fez questão de elogiar a postura de seu antecessor, Roberto Campos Neto, e dos diretores que deixaram a instituição, destacando a colaboração e o profissionalismo durante o processo de transição.

Independência em destaque: Galípolo se distancia de Haddad

A fala de Galípolo ganhou ainda mais repercussão por causa de sua trajetória. Como ex-secretário-executivo de Fernando Haddad no Ministério da Fazenda, esperava-se que ele mantivesse um discurso mais alinhado com o chefe. No entanto, ao contradizer publicamente a narrativa de Haddad, Galípolo sinalizou uma clara afirmação de independência.

Sua postura reforça a importância da autonomia institucional do Banco Central, formalizada por lei em 2021. Para analistas, foi uma tentativa consciente de preservar a imagem da autarquia e sua credibilidade junto ao mercado.

Cenário político e simbologia da transição

O pano de fundo dessas falas opostas é a difícil relação que se estabeleceu entre o Palácio do Planalto e o Banco Central ao longo dos últimos anos. Durante grande parte de 2023, o governo Lula fez críticas abertas à diretoria de Campos Neto, principalmente por não reduzir os juros no ritmo desejado pelo Executivo.

Neste contexto, a transição na presidência do BC carregava um forte simbolismo político e econômico. A fala crítica de Haddad pode ter sido, portanto, uma extensão do descontentamento acumulado, enquanto Galípolo buscou despolitizar o processo e proteger a imagem técnica da instituição.

Mercado reage às declarações

As falas divergentes não passaram despercebidas no mercado financeiro. A autonomia do Banco Central é considerada um pilar da estabilidade econômica, e qualquer sinal de interferência política tende a gerar preocupação entre investidores e analistas.

Neste sentido, a resposta de Galípolo foi bem recebida. Demonstrando serenidade e foco técnico, ele reforçou a confiança de que a gestão da política monetária continuará independente e previsível.

Já a declaração de Haddad reacendeu preocupações sobre o grau de coordenação entre política fiscal (Ministério da Fazenda) e monetária (Banco Central), e sobre o risco de novos embates públicos que possam gerar volatilidade nos mercados.

Conclusão: a importância do equilíbrio institucional

A discordância entre Fernando Haddad e Gabriel Galípolo sobre a transição no Banco Central vai além de um mal-entendido pontual. Trata-se de um episódio que expõe a delicada fronteira entre política e técnica em áreas vitais da economia.

Para que o Brasil avance com estabilidade, será fundamental que essa linha seja respeitada. Divergências devem ser debatidas internamente e com responsabilidade, a fim de evitar ruídos desnecessários que possam minar a credibilidade institucional — tanto no plano doméstico quanto internacional.

Com sua fala, Galípolo deixou um recado claro: a transição no Banco Central foi feita com respeito às normas institucionais, e a autonomia da autoridade monetária será mantida. Cabe agora aos atores políticos zelar pela harmonia entre as esferas de governo, mesmo quando a independência for um princípio — e não uma concordância automática.

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Bruno Rigacci

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