Ex-comandante do Exército nega ter barrado PMDF no QG em 8 de Janeiro

O general Júlio César de Arruda, ex-comandante do Exército Brasileiro, negou nesta quinta-feira (22) ter barrado a entrada da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) no Quartel-General do Exército, em Brasília, na noite do dia 8 de janeiro de 2023, data marcada pelos atos antidemocráticos que culminaram na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes. O local, na época, servia de acampamento para manifestantes que pediam um golpe militar.

A declaração foi feita durante o depoimento de Arruda ao Supremo Tribunal Federal (STF), como testemunha de defesa do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Cid é réu na investigação que apura uma tentativa de golpe de Estado.

“Entrada coordenada” e atuação do Exército

Questionado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, sobre a suposta ordem para impedir a entrada dos PMs no local, Arruda negou a obstrução, mas destacou que queria uma ação coordenada. “Eu não neguei. […] Quando parte dos manifestantes estava voltando para a Praça dos Cristais, recebi a informação de que a polícia ia prender todo mundo. Eu mandei coordenar isso aí”, afirmou o general. Segundo ele, uma reunião com os ministros José Múcio (Defesa), Flávio Dino (Justiça), Rui Costa (Casa Civil) e o interventor federal Ricardo Cappelli foi realizada para organizar a operação de retirada.

O relator do caso no STF, ministro Alexandre de Moraes, lembrou que a ordem para a prisão dos manifestantes partiu dele próprio e questionou o motivo da demora na ação. Moraes citou ainda o depoimento do coronel Fábio Augusto Vieira, então comandante da PMDF, que relatou ter ouvido de Arruda a frase: “O senhor sabe que minha tropa é maior que a sua”, em um suposto gesto de intimidação. O general respondeu que não se recordava da frase e reforçou que sua preocupação era evitar confrontos. “Minha função era acalmar. Isso tem que ser feito de forma coordenada”, repetiu.

Conflito entre comandos e versão da PMDF

O encontro citado por Moraes e Gonet, realizado no Comando Militar do Planalto na noite dos ataques, é uma das peças centrais na investigação. Segundo relato do coronel Fábio Augusto à Polícia Federal, o Exército teria impedido que a PM realizasse prisões dentro da área militar, criando um impasse no momento mais crítico da crise institucional.

Essa versão contrasta com a do general Arruda, que, embora reconheça a tensão do momento, insiste que nunca proibiu diretamente a entrada da PM, mas que buscava evitar uma operação descoordenada que pudesse escalar o conflito.

Testemunhas militares e defesa de Mauro Cid

O depoimento de Arruda ocorreu no âmbito da instrução do processo em que Mauro Cid é réu. O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro indicou oito testemunhas de defesa, todas militares, que estão sendo ouvidas para esclarecer sua atuação no episódio e possíveis vínculos com a tentativa de subversão democrática.

A estratégia da defesa de Cid busca demonstrar que não houve plano de golpe e que as ações atribuídas ao militar se deram dentro dos limites institucionais. Já a Procuradoria-Geral da República e o STF enxergam indícios robustos de que havia um esquema articulado para contestar os resultados eleitorais e enfraquecer as instituições.

Demissão e silêncio sobre motivo

Arruda foi exonerado do comando do Exército em 21 de janeiro de 2023, menos de duas semanas após os ataques. Questionado sobre o motivo de sua saída, o general respondeu: “Vou ser sincero: não sei. Tem de fazer essa pergunta a quem me nomeou e exonerou”, atribuindo a decisão ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A saída de Arruda ocorreu em meio a pressões internas e externas para que as Forças Armadas se posicionassem com mais firmeza diante das ameaças à democracia. Sua substituição foi vista como uma tentativa do governo de retomar o controle institucional após os acontecimentos de 8 de janeiro.

Tensão política e reverberações

O depoimento de Arruda acontece em um momento de crescente tensão entre o STF, setores das Forças Armadas e aliados do ex-presidente Bolsonaro. A tentativa de esclarecer os eventos daquela noite crucial continua a revelar conflitos internos, falhas de comando e disputas narrativas sobre a conduta das autoridades militares e civis diante da tentativa de golpe.

O caso segue sob relatoria de Alexandre de Moraes e promete desdobramentos relevantes para o futuro das investigações, que podem atingir diretamente figuras de alto escalão da gestão passada.

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Bruno Rigacci

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