Corrupção no Corinthians: remessa para empresa fantasma foi feita dentro do Parque São Jorge

A Polícia Civil de São Paulo revelou nesta semana detalhes de um esquema milionário de desvio de recursos no Corinthians, envolvendo transferências suspeitas ligadas ao contrato de patrocínio com a casa de apostas Vai de Bet, estimado em R$ 360 milhões. A investigação aponta que ao menos R$ 1,4 milhão foram desviados por meio de empresas de fachada, com indícios de ligação com o crime organizado, especialmente o Primeiro Comando da Capital (PCC).

O foco da apuração é o empresário Alex Fernando André, conhecido como Alex Cassundé, que atuou na campanha de Augusto Melo à presidência do clube. Em março de 2024, a conta oficial do Corinthians realizou duas transferências de R$ 700 mil para a empresa Social Media Design, registrada em nome de Cassundé. O montante teria origem em uma comissão irregular não prevista no contrato de patrocínio.

Da sede do clube à lavagem milionária

Com base na geolocalização do celular de Cassundé, os investigadores confirmaram que ele estava dentro do Parque São Jorge, sede do Corinthians, no momento das transferências. A partir daí, o dinheiro seguiu para uma cadeia de empresas de fachada.

Um dos primeiros destinos foi a Neoway Soluções Integradas, que recebeu R$ 580 mil. A empresa está em nome de uma jovem de 23 anos moradora da periferia de Peruíbe (SP), sem histórico empresarial compatível com os valores movimentados.

A apuração identificou que o destino final dos recursos foi a UJ Football Talent, uma agência de jogadores sem lastro financeiro, que, segundo delação do empresário Antônio Vinícius Gritzbach, é controlada por Danilo Lima, o “Tripa”, suposto traficante com ligações diretas com o PCC. Gritzbach foi assassinado em novembro de 2024, no Aeroporto Internacional de São Paulo, após fechar acordo de colaboração com o Ministério Público.

Empresas de fachada e rastros apagados

A Wave Intermediações, que repassou quase R$ 900 mil à UJ Football, foi classificada como fantasma. A empresa era formalmente controlada por um motoboy do litoral paulista e foi encerrada em 25 de abril, dois dias após o conteúdo do depoimento de Rubens Gomes (“Rubão”), ex-diretor do Corinthians, ser incluído no inquérito.

Rubão, em depoimento, afirmou que as empresas envolvidas eram de “agência de jogador, de tudo que o senhor imaginar”, mas disse não se recordar da UJ Football, embora o nome lhe fosse “familiar”.

Policiais confirmaram que os endereços registrados da Wave nunca sediaram qualquer operação real da empresa.

Ligações com campanha de Augusto Melo

O delegado Thiago Fernando Correia apura ainda se o desvio serviu para cobrir dívidas da campanha de Augusto Melo à presidência do Corinthians. Segundo os investigadores, há suspeita de que parte dos valores tenha sido utilizada para pagar fornecedores de forma irregular ou financiar compromissos políticos não declarados.

O escândalo levou a Vai de Bet a rescindir o contrato de R$ 360 milhões com o Corinthians, após a revelação do pagamento de comissão não prevista em contrato.

Posicionamento do Corinthians

Em nota oficial, o clube se declarou vítima das circunstâncias e reforçou que não tem controle sobre o destino de valores repassados a terceiros.

“O Corinthians reafirma seu total apoio às investigações e destaca que cumpre rigorosamente suas obrigações legais e contratuais. Não há, até o momento, qualquer demonstração de autoria relacionada aos fatos mencionados.”

A diretoria reforçou o compromisso com transparência, responsabilidade e justiça no esporte, e diz apoiar todas as iniciativas para apurar eventuais envolvimentos do crime organizado no futebol.

Resposta da UJ Football Talent

A UJ Football divulgou nota negando qualquer envolvimento com atividades ilícitas. A empresa afirma que é uma EIRELI conduzida por seu único proprietário legal, e que Danilo Lima não tem qualquer ligação formal ou informal com a companhia.

“A tentativa de associação da UJ a investigações criminais é infundada e carece de base legal ou factual. Qualquer insinuação de vínculo com facções criminosas é irresponsável e poderá ser judicializada.”

A empresa reconhece ter recebido valores da empresa de Lima como comissão por intermediação na transferência do jogador Emerson Royal para o Barcelona, mas afirma que a transação foi legal, declarada e dentro dos padrões do mercado.

Próximos passos da investigação

A Polícia Civil prepara agora o relatório final, que deve ser entregue nas próximas semanas com indiciamentos por furto qualificado, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A expectativa é que a apuração levante novas conexões entre figuras do esporte e estruturas de lavagem ligadas ao tráfico de drogas.

A possível entrada do Ministério Público Federal no caso, por envolver suspeitas de lavagem interestadual e internacional, está em análise. Também há pressão por parte de conselheiros do clube para que a diretoria preste novos esclarecimentos internos e colabore mais ativamente com a apuração.

Conclusão

O caso escancara uma possível infiltração de estruturas criminosas no ambiente do futebol profissional e levanta questões sobre a transparência na gestão de contratos milionários em clubes brasileiros. Se confirmadas as suspeitas, a conexão entre o patrocínio da Vai de Bet, empresas de fachada e o crime organizado poderá representar uma das maiores crises reputacionais da história recente do Corinthians.

Enquanto o clube tenta se distanciar da acusação, o impacto institucional já é sentido — e pode gerar desdobramentos não apenas criminais, mas também esportivos e políticos.

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Bruno Rigacci

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