Ex-diretor do Banco Central: ‘Existe um certo esgarçamento do instrumento taxa de juros’

A política monetária do Brasil está no limite de sua eficácia com a atual taxa de juros, afirmou Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, em entrevista ao portal PlatôBR. Com uma taxa Selic real entre as mais altas do mundo — atrás apenas da Turquia e da Rússia — Figueiredo avalia que novos aumentos nos juros seriam “contraproducentes”, podendo enfraquecer a economia sem ganhos reais no controle inflacionário.

Segundo ele, a política monetária esbarrou em dois obstáculos fundamentais: a presença maciça de crédito subsidiado, que reduz a eficácia do aumento da Selic, e o antagonismo entre o Banco Central e a política fiscal e parafiscal do governo. “O BC está tentando esfriar a economia, enquanto o governo acelera o consumo e o crédito”, explica. “Se ambos trabalhassem na mesma direção, o juro poderia ser mais baixo.”

Figueiredo, que atuou na autarquia durante o governo FHC, afirma que o Banco Central tem agido com responsabilidade técnica, mas é limitado pela falta de colaboração da equipe econômica. Ele alertou para o risco de “esgarçamento” do instrumento de juros, quando sua eficácia se torna nula ou até negativa: “Mais do que isso, o custo é muito maior do que o benefício”.

Ainda assim, ele diz que o aperto monetário atual está surtindo efeitos, mesmo que de forma lenta. “A economia está desacelerando, o câmbio valorizou, o preço das commodities caiu. Isso ajuda a conter as expectativas inflacionárias”, pondera.

Sobre o cenário internacional, Figueiredo criticou duramente a postura protecionista do ex-presidente americano Donald Trump, classificando-a como “ideologia maluca”, desconectada da realidade econômica. “Se ele insistisse, levaria os EUA à depressão, mas o mercado forçou um recuo”, disse, apontando que o risco de uma recessão global ainda existe, mas é menor com a suavização da política tarifária americana.

Críticas ao governo e cenário interno

O economista também criticou a condução da política fiscal do governo Lula (PT), apontando que a expansão dos gastos e a ausência de reformas estruturais geram insegurança nos investidores e minam o controle da inflação. Segundo ele, a atual meta inflacionária de 3% ao ano é adequada — e revisá-la para cima, como defendem setores do governo, seria um retrocesso. “Inflação alta castiga os mais pobres. Já passamos por isso”, afirma.

Embora reconheça o esforço do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para atrair investimentos, Figueiredo vê o ambiente atual como hostil aos negócios. “Houve uma saída histórica de capital estrangeiro. Os investidores estão se desapontando com o Brasil”, diz.

Futuro do Banco Central

Ao comentar os 60 anos do Banco Central, Figueiredo destaca dois grandes desafios para a instituição: manter sua autonomia diante de pressões políticas e garantir a continuidade do processo de modernização do sistema financeiro iniciado sob a gestão de Roberto Campos Neto, incluindo avanços como o PIX.

Para ele, a liderança brasileira em inovação financeira pode se manter, mas o nível de entrega dependerá do comprometimento da próxima equipe. “O legado estrutural do BC é o que realmente faz diferença para o país no longo prazo.”

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Bruno Rigacci

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