Ex-chefe do INSS negou fraudes ao Congresso às vésperas de ser desmentido pela PF

Menos de três semanas antes da deflagração da operação “Sem Desconto”, que revelou um esquema bilionário de fraudes e descontos indevidos em benefícios do INSS, o então presidente do órgão, Alessandro Stefanutto, afirmou ao Congresso que não havia indícios de dolo, fraude ou erro administrativo relacionados ao caso.

O documento, datado de 7 de abril, foi elaborado em resposta a um pedido de informação da deputada Júlia Zanatta (PL-SC), que já alertava sobre denúncias de descontos não autorizados, inclusive citando uma reportagem exibida no Jornal Nacional em novembro de 2023. A resposta só foi oficialmente enviada ao Congresso nesta semana, pelo Ministério da Previdência Social — após a operação da Polícia Federal, realizada em 23 de abril.

Contradição com resultados da investigação

As investigações da Polícia Federal e da CGU revelaram que cerca de 6 milhões de aposentados e pensionistas foram afetados por descontos indevidos, gerando um prejuízo estimado de R$ 6,3 bilhões. Entre os casos mais graves, estão vítimas com doenças incapacitantes, pessoas indígenas analfabetas e até brasileiros residentes no exterior que jamais teriam autorizado qualquer desconto.

Apesar disso, Stefanutto sustentou, em sua resposta ao Congresso, que as entidades que aplicavam os descontos estavam passando por “verificações extraordinárias”, e que somente após a análise da defesa dessas entidades seria possível um diagnóstico conclusivo.

Biometria: promessa não cumprida

No mesmo documento, Stefanutto destacou a criação de uma nova regra, em março de 2024, exigindo biometria e assinatura eletrônica avançada para autorizar descontos. A regra, no entanto, não impediu que o esquema continuasse ativo.

De acordo com a investigação, servidores do INSS liberaram descontos usando um sistema de biometria alternativo e precário, antes que o sistema oficial da Dataprev fosse totalmente implementado. A brecha permitiu que os descontos considerados indevidos continuassem sendo aplicados ao longo de 2024.

Ação do governo: atrasada e sem prazo para ressarcimento

Somente após forte repercussão e pressão pública, o governo anunciou uma força-tarefa a partir de 13 de maio para identificar e notificar os beneficiários que tiveram descontos. Os aposentados e pensionistas serão avisados pelo aplicativo “Meu INSS” e precisarão confirmar se autorizaram os débitos.

Se houver negativa, as associações terão de comprovar a autorização ou arcar com o ressarcimento. No entanto, o governo ainda não estabeleceu um prazo para que os valores desviados sejam devolvidos às vítimas.

Crise de confiança e desgaste político

A revelação de que o então presidente do INSS minimizou o problema poucas semanas antes da operação da PF agrava o desgaste político do governo Lula, que já enfrenta críticas por não ter interrompido o esquema no início do mandato, apesar dos alertas anteriores.

A demissão de Stefanutto e do ministro da Previdência, Carlos Lupi, foi anunciada após a operação, mas até o momento não há garantias de que as vítimas serão ressarcidas integralmente nem de que o sistema foi blindado contra novas fraudes.

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Bruno Rigacci

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