Filha de desembargador deu “presente” para o pai com dinheiro de propina, diz a PF

Mato Grosso do Sul voltou a ser palco de um escândalo de corrupção no Judiciário. A Polícia Federal (PF) revelou, em representação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), que a advogada Renata Pimentel, filha do desembargador afastado Sideni Soncini Pimentel, usou dinheiro proveniente de propina para comprar uma caminhonete de R$ 217 mil como presente para o pai. Esta compra, segundo a PF, faria parte de um esquema mais amplo de venda de decisões judiciais dentro do Tribunal de Justiça do estado (TJ-MS), uma prática que envolvia valores milionários e a atuação de magistrados corruptos.

O desdobramento da Operação Ultima Ratio

Sideni Pimentel foi afastado de suas funções em outubro de 2024, após a deflagração da Operação Ultima Ratio, uma investigação conduzida pela Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros da PF. A operação tem como foco a investigação de um esquema criminoso que envolvia a venda de sentenças, com a participação de desembargadores e outros magistrados. A PF acredita que, ao longo de sua atuação, Renata intermediou o pagamento de propinas que somam R$ 920 mil, repassados em benefício de seu pai, Sideni, e outros magistrados.

Provas comprometedoras: conversas e documentos

A operação obteve acesso a conversas comprometedoras entre Renata e o próprio pai, nas quais ela confirma a compra da caminhonete. Em uma das mensagens recuperadas, a advogada diz: “Comprei essa camionete para você”. Além disso, diálogos entre Renata e representantes de uma concessionária de veículos, bem como com funcionários de um banco, também foram encontrados. Nesses diálogos, ela trata sobre o financiamento do veículo e até tenta antecipar o pagamento das parcelas, em uma transação que se revela suspeita.

De acordo com as investigações, a caminhonete foi inicialmente financiada, mas dias depois Renata tentou quitar o saldo devedor de R$ 213 mil em espécie. No entanto, a gerente do banco recusou o pagamento em dinheiro devido a uma regra do Banco Central, que proíbe transações em espécie acima de R$ 10 mil. A recusa da gerente foi registrada, e ela ainda mencionou que esse tipo de situação era comum entre clientes ligados ao Tribunal de Justiça do estado.

A tentativa de mascarar a origem do dinheiro

Outro detalhe crucial revelado pela PF foi uma conversa entre Renata e seu contador, na qual ela tenta justificar a origem do dinheiro usado para quitar a caminhonete. “E se eu disser que foi honorário?”, perguntou ela ao contador, sugerindo uma tentativa clara de disfarçar a origem ilícita dos recursos. O contador, por sua vez, sugeriu que o valor fosse declarado como um “empréstimo do sócio para empresa”, mais uma tentativa de mascarar a real procedência do dinheiro.

Venda de fazenda e a liberação judicial

Outro aspecto relevante da investigação envolve a intermediação de Renata na venda de uma fazenda, que teve um bloqueio judicial suspenso graças a uma decisão dos desembargadores envolvidos no esquema. A PF descobriu que Renata atuou diretamente na negociação da propriedade, que estava disponível para venda apenas porque a decisão judicial que a liberava havia sido favorecida por um esquema de corrupção. Sideni Pimentel, juntamente com outros magistrados, foi responsável por essa liberação, o que indica a extensão do envolvimento dele no esquema criminoso.

O futuro da investigação: possíveis denúncias da PGR

A representação encaminhada ao STF possui 281 páginas e detalha, minuciosamente, como funcionava o esquema de venda de sentenças e como Renata, ao longo de meses, agiu como intermediária das transações ilícitas. A Procuradoria-Geral da República (PGR) agora analisa o material apresentado para decidir se apresentará uma denúncia formal contra Sideni Pimentel e outros envolvidos no esquema.

Embora o desembargador já tenha sido afastado do cargo, ele continua recebendo o salário referente à sua posição, o que tem gerado grande revolta em diversos setores da sociedade. O caso reacende o debate sobre a responsabilidade dos membros do Judiciário e a proteção oferecida por prerrogativas de foro, além do corporativismo institucional, que muitas vezes facilita a impunidade entre as altas autoridades do sistema judiciário.

Repercussão e exigência de mais transparência no Judiciário

Este escândalo de corrupção, que já está repercutindo nacionalmente, gerou indignação em várias entidades jurídicas e sociais. A sociedade exige maior transparência nas atuações dos magistrados, principalmente quando há envolvimento de familiares atuando como advogados, como no caso de Renata. Além disso, o caso levanta a questão sobre o controle das movimentações financeiras e decisões judiciais, principalmente quando envolvem grandes somas de dinheiro.

O avanço da investigação promete trazer mais revelações sobre o funcionamento de esquemas criminosos no Judiciário de Mato Grosso do Sul. Caso as acusações sejam confirmadas, o escândalo pode ser considerado uma das maiores crises dentro do Judiciário estadual dos últimos anos, com repercussões que podem abrir precedentes importantes para o combate à corrupção institucionalizada no Brasil.

O desfecho do caso dependerá agora da decisão da PGR e do STF, com a expectativa de que o Judiciário, finalmente, tome medidas enérgicas para combater a corrupção em suas fileiras.

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Bruno Rigacci

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