Fraude a aposentados: ex-chefe do INSS liberou descontos irregulares

O ex-presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, está no centro de um dos maiores escândalos de corrupção da história recente da Previdência. Apesar de ter se posicionado publicamente como defensor de medidas rigorosas contra fraudes em benefícios, Stefanutto autorizou a retomada de descontos associativos suspeitos nos contracheques de aposentados e pensionistas, contrariando os próprios alertas feitos por órgãos de controle e sem respaldo técnico ou normativo.

A revelação faz parte do inquérito da Operação Sem Desconto, conduzida pela Polícia Federal, que apura um esquema bilionário de desvios de valores por meio de descontos não autorizados em benefícios previdenciários. As investigações apontam que, mesmo após prometer medidas enérgicas — incluindo acionamento da PF e suspensão dos descontos — Stefanutto deu aval a um “desbloqueio excepcional” em favor de entidades já sob investigação.

Duplo discurso e manobras internas

Em abril de 2024, sob pressão da Controladoria-Geral da União (CGU), Stefanutto prometeu “ser duro” com fraudes e anunciou o desenvolvimento de ferramentas como biometria facial e assinatura eletrônica avançada para validação dos descontos. No entanto, segundo a PF, enquanto divulgava publicamente essas medidas de controle, internamente o ex-presidente trabalhava para liberar os descontos de forma transitória.

A contradição veio à tona com documentos obtidos pela PF, que mostram que, em junho de 2024, Stefanutto autorizou descontos mesmo sem a implantação dos mecanismos prometidos. Para os investigadores, a atuação da cúpula do INSS beneficiou exclusivamente entidades associativas, contrariando o interesse dos beneficiários.

“As ações divulgadas pelo INSS para impor maior rigor […] não atingiram os efeitos a que se propuseram […] o único interesse observado foi o das entidades associativas”, diz o relatório da PF.

Descontos em lote e suspeitas de propina

Um dos episódios mais graves envolve a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). A PF afirma que, sem qualquer verificação de dados, Stefanutto autorizou o desbloqueio em lote de descontos em pelo menos 34 mil benefícios, apoiando-se unicamente na “boa-fé” da entidade.

A autorização partiu após parecer favorável de Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, então chefe da Procuradoria Federal do INSS, que inicialmente havia negado o pedido. Segundo a PF, Virgílio teria recebido R$ 12 milhões em propina de intermediários do esquema. O então diretor de Benefícios do INSS, André Paulo Félix Fidélis, também é citado, tendo recebido R$ 5 milhões, conforme os investigadores.

Ao todo, a gestão de Stefanutto permitiu 785.309 novos descontos, envolvendo 32 entidades, todos aprovados com base apenas em termos de compromisso das associações — sem auditorias, sem checagem e sem consentimento formal dos aposentados.

Queda e silêncio

Diante do avanço das investigações, Alessandro Stefanutto foi afastado por ordem judicial e, em seguida, pediu demissão do cargo. Procurado pelo jornal O Estado de S. Paulo, o ex-presidente do INSS não respondeu aos questionamentos.

A Polícia Federal segue apurando o envolvimento de outros servidores e entidades no esquema que pode ter causado um rombo superior a R$ 6,3 bilhões, afetando diretamente centenas de milhares de aposentados e pensionistas.

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Bruno Rigacci

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