Gilmar defende continuidade de Moraes como relator do 8/1
O ministro decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, rejeitou neste sábado (12) qualquer tentativa de comparação entre seu colega de Corte Alexandre de Moraes e o senador e ex-juiz Sergio Moro. Segundo Gilmar, não há fundamento nas acusações de que Moraes estaria violando o devido processo legal ao conduzir processos nos quais ele próprio figura como vítima, no contexto das ações sobre os atos de 8 de janeiro de 2023.
Gilmar defendeu com firmeza a permanência de Moraes na relatoria das ações. Ele argumentou que o ministro já exercia essa função antes dos acontecimentos que o colocaram como alvo dos ataques. Por isso, segundo o decano, não há impedimento legal ou ético. “Não há justificativa para ele [Moraes] ser afastado, uma vez que ele já era relator desses inquéritos e depois dos inquéritos que se agregaram. Ele não é suspeito, não está impedido, não está julgando no seu interesse”, afirmou.
Ao comentar a tentativa de traçar um paralelo entre Alexandre de Moraes e Sergio Moro, Gilmar Mendes foi categórico: “Não se pode nem de longe comparar Alexandre com Moro. Moro, de fato, se associa ao Bolsonaro.” A fala ocorreu durante sua participação na 11ª edição da Brazil Conference, realizada na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.
Durante o painel, Gilmar Mendes também voltou a tecer duras críticas à operação Lava Jato e ao papel de Moro enquanto juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba. Gilmar afirmou que se orgulha de ter contribuído para o “desmanche da operação” e classificou o que existia em Curitiba como uma “organização criminosa”. Ele relembrou que, embora inicialmente tenha apoiado a força-tarefa, passou a rever suas posições à medida que vieram à tona os excessos, parcialidades e desvios de conduta na condução dos processos.
O ministro também abordou críticas de que o STF estaria ultrapassando os limites de suas atribuições, prática que vem sendo chamada por alguns setores políticos de “ativismo judicial”. Gilmar rejeitou esse rótulo e afirmou que, na verdade, há uma incompreensão generalizada sobre as competências constitucionais do Supremo. Para ele, o tribunal tem apenas cumprido o papel que lhe foi atribuído pela Constituição de 1988.
Ao fazer um balanço sobre os últimos dez anos de atuação da Corte, Gilmar apontou mudanças internas importantes. Segundo ele, os ministros têm se esforçado para superar a visão de um Supremo pautado por decisões isoladas ou personalistas. “Protagonizar o tribunal. Esse é um grande aprendizado”, disse o ministro, ao se referir ao esforço coletivo por uma atuação institucional mais coesa.
A fala de Gilmar Mendes ocorre em um momento de forte polarização política no país, onde decisões do STF — especialmente em relação aos atos do 8 de janeiro, à condução de investigações contra parlamentares e influenciadores digitais e à regulação das redes sociais — têm sido alvo de críticas por parte de grupos ligados à oposição.
No entanto, o decano da Corte reforça a importância da atuação firme do Judiciário em defesa da ordem constitucional e contra ameaças ao Estado Democrático de Direito. Para ele, a estabilidade democrática do Brasil passa necessariamente pela atuação independente e corajosa do STF diante de crises institucionais.
A postura crítica em relação a Sergio Moro também reacende debates sobre a politização do Judiciário e os impactos da Lava Jato na democracia brasileira. Para Gilmar, a operação extrapolou os limites legais e gerou danos profundos ao sistema político e à imagem do Judiciário. Em diversas ocasiões, ele já apontou o conluio entre juízes e procuradores como um dos principais vícios do modelo da Lava Jato.
Ao criticar Moro, Gilmar Mendes também enfatizou que o ex-juiz que se tornou político perdeu a imparcialidade necessária para conduzir os processos que julga, o que o diferencia radicalmente de Alexandre de Moraes, na sua visão. A associação de Moro com Bolsonaro, segundo Gilmar, comprometeu sua isenção e deixou evidente seu projeto de poder.
O episódio reforça a divisão existente dentro e fora do STF sobre os rumos do Judiciário e o legado da Lava Jato. Para Gilmar, o momento exige reflexão, especialmente diante das consequências jurídicas, políticas e institucionais provocadas por decisões que extrapolam os limites constitucionais. Ele defende que o Judiciário deve manter a sobriedade e atuar com base na Constituição, mas sem se acovardar diante de ataques à democracia.
Em sua participação na Brazil Conference, Gilmar também destacou a importância do fortalecimento das instituições e da cultura democrática. Ele ressaltou que, apesar das turbulências recentes, o Brasil tem mostrado resiliência institucional e capacidade de se reinventar diante de crises graves.
Com sua fala, o ministro reforça o papel do Supremo como guardião da Constituição e lança mais um capítulo na longa disputa narrativa sobre o papel do Judiciário no cenário político brasileiro, especialmente em tempos de radicalização e desinformação.