Gilmar Mendes afasta principal tese de Bolsonaro no inquérito do suposto golpe
O ministro decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, refutou com veemência a principal tese utilizada pela defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro no chamado “inquérito do golpe”. Em entrevista à coluna, Mendes explicou que o planejamento de um golpe de Estado é um crime em si, mesmo que os envolvidos não tenham efetivamente pegado em armas ou tentado executá-lo fisicamente. O ministro destacou a gravidade dos atos preparatórios, defendendo que em casos de crimes contra o Estado de Direito e a democracia, esses atos são, muitas vezes, já criminalizados devido ao potencial de desestabilizar o sistema democrático.
“Há a ideia de que, em princípio, atos preparatórios nada têm a ver com a eventual prática de crime. Só que, nesses casos de crimes contra o Estado de Direito e crimes contra a própria democracia, normalmente nós falamos de atos preparatórios que já são criminalizados. Até porque se o crime é bem-sucedido, ele se complementa. Na verdade, nós não vamos ter mais o Estado de Direito. Aquela situação que era ilícita passa a ser lícita. Nós vamos ter uma nova ordem”, afirmou o ministro.
Gilmar Mendes continuou, explicando que não se tratava apenas de um “pensamento” ou ato puramente teórico. Ele destacou que, se houve envolvimento de recursos financeiros, monitoramento de pessoas para ações criminosas e documentos comprometendo as autoridades, a situação se torna muito mais concreta e grave do que um simples “ato cerebral”. Ele também mencionou a investigação da Polícia Federal, que inclui mais de 800 páginas de relatórios, e evidências de planejamentos concretos para ações violentas.
“O relatório tem mais de 800 páginas. Nós vemos atos muito mais concretos. Quando se trata, por exemplo, de falar do assassinato do presidente da República eleito, do vice-presidente eleito, do assassinato de um ministro do Supremo. São coisas de extrema gravidade”, declarou Mendes, referindo-se ao planejamento e aos recursos envolvidos, como dinheiro e veículos, que foram utilizados por indivíduos com cargos públicos para realizar monitoramentos e outras ações.
Além disso, o ministro enfatizou que as investigações revelaram documentos comprometedores encontrados no Palácio do Planalto e comunicações entre os envolvidos, o que demonstra que as ações planejadas estavam bem articuladas e longe de serem simples intenções. “Todos tinham cargos públicos. Então tudo isso é bastante sério”, completou Mendes.
Por outro lado, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) reagiu à operação da Polícia Federal e ao indiciamento de seu pai, argumentando que, embora fosse repugnante pensar em matar alguém, isso não configuraria crime, já que, para haver uma tentativa de assassinato, a execução do ato precisaria ser interrompida por fatores externos à vontade dos agentes, o que, segundo ele, não parece ter ocorrido.
A troca de argumentos entre ministros do STF e defensores de Bolsonaro sobre o caso reforça a polarização e a complexidade do processo, que envolve alegações graves de atentados contra a ordem democrática e os pilares da República.