Lula condecorou ditador Sírio Bashar Al-Assad com a mais Alta Honraria Brasileira
A condecoração do Grande-Colar da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul concedida ao presidente sírio Bashar Al-Assad em 2010, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, gerou controvérsias que reverberam até os dias atuais. A honraria é a mais alta distinção oferecida pelo governo brasileiro a líderes estrangeiros e foi dada ao ditador sírio durante uma visita oficial ao Brasil.
Contexto da Condecoração
Em junho de 2010, Bashar Al-Assad recebeu a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul como parte de sua visita ao Brasil, em um contexto de estreitamento das relações bilaterais. A visita foi uma retribuição à viagem de Lula à Síria em 2003, que havia sido marcada pela assinatura de vários acordos, incluindo cooperação jurídica, programas nas áreas de saúde e educação, e o aumento significativo do comércio entre os dois países.
Entre 2003 e 2009, o comércio bilateral entre Brasil e Síria cresceu de US$ 78 milhões para US$ 307 milhões, o que refletia um fortalecimento das relações econômicas e diplomáticas entre as duas nações.
Durante sua visita, Assad foi recebido por Lula e outras autoridades brasileiras, além de se reunir com membros da comunidade síria no Brasil, que é uma das maiores do mundo, com cerca de 4 milhões de descendentes.
O Contexto Internacional e a Imagem de Assad
Na época, a visita de Bashar Al-Assad ocorreu em meio à Primavera Árabe, quando manifestações contra regimes autoritários e pela democracia e liberdade eclodiram em vários países árabes. Assad, que já havia iniciado a repressão violenta aos protestos contra seu governo, foi amplamente criticado internacionalmente por sua postura autoritária, sendo considerado por muitos como um tirano e, mais tarde, responsável por graves violações de direitos humanos durante a guerra civil síria.
Assad buscava apoio político na América Latina, sendo recebido por outros líderes como Hugo Chávez da Venezuela, Raúl Castro de Cuba, e Cristina Kirchner da Argentina. O Brasil, no entanto, representava o principal aliado na América do Sul para o regime sírio, com a visita de Assad simbolizando uma aliança política em tempos de isolamento diplomático.
Controvérsias e Pedido de Revogação
A decisão de Lula de conceder o Grande-Colar a Assad gerou controvérsias tanto internamente, no Brasil, quanto internacionalmente. Desde que Assad se tornou alvo de críticas internacionais pela violência contra a oposição e pelas atrocidades cometidas durante o conflito sírio, a concessão da maior honraria brasileira a um líder tão polarizador tem sido questionada.
Em 2018, o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) apresentou um projeto na Câmara dos Deputados pedindo a revogação da condecoração. Ele argumentou que, ao receber a homenagem, Assad já era amplamente reconhecido por seu regime autoritário, que se sucedia ao regime de seu pai, Hafez Al-Assad, e que o governo brasileiro deveria corrigir essa associação com ditadores.
O projeto foi ganhando apoio ao longo dos anos, e em 2023, o deputado Rodrigo Valadares (União-SE) se posicionou favoravelmente, dizendo que a revogação seria o “primeiro passo” para corrigir qualquer ligação do Brasil com ditadores. No entanto, desde então, o projeto está parado na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CREDN) e na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), sem previsão de avanço.
O Grande-Colar da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul
A Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul é uma das mais tradicionais condecorações do Brasil, criada em 1949, e é destinada a homenagear estrangeiros que se tornaram dignos do reconhecimento da nação brasileira. O Grande-Colar é o grau mais alto da honraria, reservado a chefes de Estado e figuras políticas que, por circunstâncias especiais, merecem a gratidão e o reconhecimento do governo brasileiro.
Nos últimos anos, outras figuras políticas, como Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai, Emmanuel Macron, presidente da França, Alberto Fernández e Cristina Kirchner, ex-presidentes da Argentina, e Gabriel Boric, presidente do Chile, também receberam essa distinção. Contudo, a concessão ao líder sírio gerou uma polêmica difícil de apagar, dado o contexto de seu regime e as atrocidades cometidas durante sua presidência.
Reflexão sobre o Passado e as Relações Internacionais
A entrega da Ordem ao líder sírio em 2010 é um exemplo de como a diplomacia brasileira pode ser ambígua, dependendo dos objetivos estratégicos e do contexto político da época. A relação com a Síria refletia uma política externa voltada para estreitar laços com países do Oriente Médio, que se manifestava na promoção de cooperação econômica e cultural, especialmente no que diz respeito à presença da grande comunidade árabe no Brasil.
No entanto, à medida que a situação internacional se intensificou e o regime de Assad se tornou cada vez mais autoritário, a decisão do governo brasileiro passou a ser vista de forma muito diferente, com críticos apontando que a concessão da maior honraria do país a um ditador que perpetuava um regime opressor foi um erro diplomático. A revogação da honraria, embora ainda pendente, representa uma tentativa de corrigir essa associação e de reafirmar os valores democráticos do Brasil no cenário internacional.