Moraes comete duas novas ilegalidades no caso do réu do relógio, aponta jurista
A recente decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de revogar de ofício a soltura de Antonio Claudio Alves dos Reis — o homem que quebrou um relógio histórico durante os atos de 8 de janeiro — reacendeu o debate sobre os limites da atuação do Judiciário. A medida contraria, segundo especialistas, a jurisprudência pacífica do próprio STF, que determina que decisões favoráveis ao réu não podem ser reformadas sem provocação do Ministério Público ou sem que a defesa seja ouvida.
O jurista André Marsiglia, conhecido por sua atuação em defesa das liberdades fundamentais e do devido processo legal, apontou uma série de irregularidades na decisão do ministro. Para ele, a revogação da liberdade do réu sem requerimento do MP é ilegal, assim como a ordem para investigar o juiz de Minas Gerais que autorizou a soltura.
“Nesse específico caso, a questão nem é se o réu tinha ou não direito à progressão, mas por que o juiz de MG agiu sozinho, sem a ‘benção’ do STF, sobretudo deferindo soltura sem tornozeleira”, escreveu Marsiglia nas redes sociais. “Seja como for, Moraes não poderia ter revogado a prisão de ofício.”
O ponto mais polêmico, no entanto, foi a determinação de Moraes para que o juiz mineiro seja investigado por ter concedido liberdade ao réu. Marsiglia criticou duramente essa medida: “Moraes também não pode mandar o juiz de MG ser investigado. Ele não é corregedor. No máximo, pode encaminhar o caso para análise da corregedoria. Esse caso do réu do relógio é, de fato, inteiro esquisito.”
Segundo o regimento interno do STF, em ações penais originárias, o relator atua como juiz da execução e tem competência para supervisionar o cumprimento das penas. No entanto, mesmo dentro dessa prerrogativa, especialistas afirmam que o devido processo legal exige provocação formal ou, ao menos, o contraditório — o que, ao que tudo indica, não ocorreu.
A decisão levanta questões delicadas sobre o equilíbrio entre o poder de controle do STF sobre os réus dos atos de 8 de janeiro e os limites legais dessa supervisão. O caso ainda deve gerar desdobramentos dentro da magistratura e entre entidades de classe, especialmente no que diz respeito à independência funcional de juízes de primeira instância.
Enquanto isso, o “réu do relógio” continua detido, e o debate jurídico se intensifica — com implicações que vão além do caso em si, tocando no próprio funcionamento do sistema de Justiça brasileiro.